Xabi Alonso e um jogo a régua e esquadro

Uma fotografia sem cor, um homem de costas e uma mão erguida em forma de despedida. O rosto, esse, espreita meio de lado, meio para trás. As...

Uma fotografia sem cor, um homem de costas e uma mão erguida em forma de despedida. O rosto, esse, espreita meio de lado, meio para trás. As botas já não pertencem aos pés e vão, agora, nas mãos. Uma forma simples de dizer que chegou aquela maldita hora. É desta maneira discreta que um dos melhores desliga as luzes e abandona o seu palco. O Xabi acaba no fim desta época e isso é desolador!



O tempo tudo traz e tudo leva. Por nós já passaram grandes estrelas da bola e lá nos tentamos sempre afeiçoar à ideia de que, um dia, a qualquer momento, aparece outro igual ou melhor. Mas, na verdade, nunca esquecemos os que tanto deram e fizeram pelo nosso jogo, o tal "jogo bonito". 

Xabi, o arquitecto espanhol, responsável por ligar o jogo das equipas por onde passava, aparecia fora do bloco adversário e ditava os ritmos de jogo com uma preciosidade rara. Alguém que nunca precisou de passar as pernas por cima da bola à velocidade da luz para se impor, muito menos marcar golos desalmadamente para chegar ao estrelato. Na verdade, tudo o que fazia era bem feito, inteligente e fulcral, notável numa era em que o futebol se torna cada vez mais físico. Limitava-se a usar primeiro o cérebro e só depois os pés. Fotógrafo nato, tinha o dom de ver o que lhe estava à frente do nariz - mais do que a grande maioria - porque jogar de cabeça levantada é diferente.

Agora, que já sabemos do seu adeus, ficamos a pensar na cratera qualitativa que nos resta. Há jogadores que saem e nada deixam e há outros, como Xabi, que vão e tudo levam. Como tantas vezes fez, aquele homem discreto passa a bola a outro. Talvez a aproveite o nosso Renato. Talvez olhemos com saudade e percebamos a diferença entre um grande operário e um arquitecto.




Tiago Carvalho

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